sábado, 31 de dezembro de 2011

Feliz 2012

Amigos, feliz ano novo para todos vocês, e que esse ano de 2012 seja cheio de realizações e muita paz!
Deixo uma reflexão retirada do livro A arte da prudência, de Baltazar Gracián: "Aprenda a fazer vista grossa à maior parte do que acontece entre amigos, conhecidos e principalmente inimigos. Tudo que é mesquinho irrita e, dependendo da condição, molesta. Respirar algo desagradável é uma espécie de mania. Em geral, o mesmo acontece com a maneira de se comportar, que varia segundo o coração e a capacidade de cada um".
Feliz 2012!

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Amazing Grace

Essa é a história de um dos mais belos hinos em estilo "spiritual gospel" composto por John Newton, ex-traficante de escravos que teve um encontro com Deus ao ouvir essa melodia, vindo talvez dos porões do navio negreiro que conduzia, abarrotado de homens e mulheres, arrancadaos de sua terra - o continente africano - para serem escravizados na América. Veja abaixo a letra e sua tradução e assista ao vídeo clicando no link.

Amazing Grace

Amazing grace, oh how sweet the sound
That saved a wretch like me
I once was lost, though now I'm found
I was blind, but now I see
When we've been there ten thousand years
Bright shining as the sun
We've no less days to sing God's praise
Then when, when we first begun
Through many dangers, toils and snares,
I have already come
Jesus' grace that brought me safe thus far,
and grace will lead me home.
Amazing grace, oh how sweet the sound
To save a wretch like me

I once was lost, but now I'm found
I was blind, but now I see

Maravilhosa Graça

Maravilhosa Graça, Oh quão doce é o som
Que salvou um miserável como eu
Eu estava perdido, mas agora eu me encontrei
Eu estava cego, mas agora eu vejo.
Quando estivermos lá há 10 mil anos,
Brilhantes como a luz do sol,
Não teremos menos dias para cantar louvores a Deus
Do que quando, quando começamos no princípio
Por muitos perigos, labutas e armadilhas,
Eu já passei
A graça de Jesus me trouxe seguro, tão distante,
e a graça me conduzirá até o lar.
Maravilhosa Graça, Oh quão doce é o som
Que salvou um miserável como eu

Eu estava perdido, mas agora eu me encontrei
Eu estava cego, mas agora eu vejo.

 VÍDEO
http://youtu.be/3la3ROhGIOU

domingo, 4 de setembro de 2011

Freud e as pessoas "que não querem incomodar". Parte 1

Já ouviu aquela história do sujeito que é convidado para algum evento e responde com questionamentos sobre a intenção de quem o convidou e depois ainda diz que não quer incomodar?
A cena é mais ou menos assim:
- Oi Juliana, quanto tempo né menina, quer almoçar comigo logo mais?
- Não vai lhe atrapalhar? Sei lá, você é tão ocupado, de repente você pode querer almoçar com outras pessoas.
- Claro que não Juliana, se estou lhe convidando...
- É, mas, você pode ter  algum compromisso e aí eu vou acabar te atrapalhando e eu não quero incomodar.
Outro exemplo ainda mais contundente que o anterior: um sujeito oferece uma carona para outro pelo simples fato de que obrigatoriamente passará pelo lugar para o qual o outro está indo, e obtém como resposta a pérola abaixo, que como veremos, acaba em recusa:
- Não vai lhe atrasar? Sei lá, não quero incomodar. Melhor não, não quero tirar você de seu caminho, eu dou um jeito, pode ir...

Bem, porque será que essas pessoas se preocupam tanto em não incomodar, não atrapalhar? Certamente não é porque desejem isso. Aprendemos com Freud que existem motivos ocultos (inconscientes) por trás dessa aparente benevolência.
O principal motivo parece ser o desejo (inconsciente ou não) de não estar com a pessoa que o convida, seja por alguma rusga não resolvida no passado e causadora de ressentimentos presentes, seja por uma autoestima baixa que corre o risco de piorar na presença do outro, ou mesmo por uma agressividade dissimulada em que a recusa ao convite faz a função de elemento punitivo.
Um outro elemento interessante é a onipotência do pensamento do sujeito que "não quer incomodar", ele pensa por todos, e se julga conhecedor do pensamento alheio. Para esses indivíduos, a palavra do outro que oferece ajuda não merece crédito, pois, ele prefere crer em suas fantasias de estar incomodando, apesar de todas as alegações em contrário, e isso é que realça o caráter irracional dessa conduta.

Há também aqueles casos que decorrem de um temperamento extremamente introvertido, ou  ainda aqueles indivíduos que se encontram com distúrbios de comportamento, em que os sintomas de isolamento ou fobia social os leva a restringir (ou mesmo a abolir, nos casos mais graves) seus contatos com o semelhante.
Entretanto, excetuando-se os casos em que o sujeito utiliza esse argumento (não querer incomodar) de forma consciente para fugir a um encontro desagradável, ou é fruto de algum distúrbio psicológico, nos demais casos podemos ver traços de soberba em ação, camuflada sob a aparência de uma preocupação com o outro.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

José Régio

Não conhecia José Régio (pseudônimo literário de José Maria dos Reis Pereira) até ler o poema Cântico Negro, postado no blog Peroratio, e ser capturado pela bela reflexão poética profunda contida em seus versos. Pesquisando na internet, descobri que o poeta nasceu em Vila do Conde, Portugal, em 1901, formou-se em Letras em Coimbra, ensinou durante mais de 30 anos no Liceu de Portalegre e foi um dos fundadores da revista literária "Presença".
Romancista, dramaturgo, ensaísta, novelista, contista, memorialista, jornalista, historiador da literatura, crítico e acima de tudo Poeta. De acordo com Arnaldo Nogueira Jr. (www.releituras.com/) em seu “livro de estreia — Poemas de Deus e do Diabo — apresentou quase todo o elenco dos temas que viria a desenvolver nas obras posteriores: os conflitos entre Deus e o Homem, o espírito e a carne, o indivíduo e a sociedade, a consciência da frustração de todo o amor humano, o orgulhoso recurso à solidão, a problemática da sinceridade e do logro perante os outros e perante a si mesmos”. O Poeta faleceu em 1969 em sua cidade natal.

Cântico negro
José Régio

"Vem por aqui" — dizem-me alguns com os olhos doces
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui!"
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...
A minha glória é esta:
Criar desumanidades!
Não acompanhar ninguém.
— Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre à minha mãe
Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...
Se ao que busco saber nenhum de vós responde
Por que me repetis: "vem por aqui!"?

Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí...
Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.

Como, pois, sereis vós
Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?...
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...

Ide! Tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátria, tendes tetos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios...
Eu tenho a minha Loucura !
Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...
Deus e o Diabo é que guiam, mais ninguém!
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.

Ah, que ninguém me dê piedosas intenções,
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou,
É uma onda que se alevantou,
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
Sei que não vou por aí!




terça-feira, 26 de julho de 2011

Arriete Vilela - Poesia das Alagoas

NÃO IREI ALÉM...
                                                                                        

                                                                                                                                                                                Não irei além da palavra
                                                         que atormentará a tua noite
insone nem além do espelho
que não te revelará em que sulcos
da tua alma caminhei em silêncio,
numa leveza quase agressora,
para que teu amor opaco e viscoso pudesse
fingir-se de miragem.
Não irei além dos tules, dos tafetás,
dos morins nem das sedas
com que criaste o cenário
desta solidão em que ensaio o nosso
último gesto:
mãos vazias na direção dos ventos tempestuosos.
Não irei além do teu entendimento,
mesmo que te debruces sobre os meus escritos
com a voracidade cega e triste do fogo que destrói
enredos, malfadados ou não.
Não irei além dos teus afetos
soterrados em vãs promessas, em vãs esperanças,
em vão apelos,porque sou, hoje,
coração revestido de invencível distância.
Não irei além do cheiro de maresia
vindo do passado, com as bandeirolas,
nas manhãs de domingo,
agitando-se ao anúncio da bem-aventurança
sempre no próximo porto,
sempre na próxima hora,sempre no depois.
Não irei além do que sou,nem dos meus aprendizados
na águas do meu signo,
nem das minhas andanças ao redor do umbigo
da província.
Não irei além de mim nem de ti,
ambos gaivota e águia,ambos aves de arribação,
ambos ilha e barco à deriva,ambos deserto e oásis.
Não irei além do que, hoje, é flor e nuvem,
vinho branco em taças renovadas,
aceno leve à partida da jangada de vela branca.
Não irei além da mansidão com que outros corpos
me chegam, como sons de saxofone
através da noitesem cintilações -
sequer as do anjo -,
nem irei além dessas ternuras arando
corações que um dia se fizeram desejo
e alegria, paixão e epifania.
Não irei além dos traços na obliqüidade
da minha vida, nem das redes que lanço
em rios de seixosa margem,nem além dos cajueiros
em flor à beira da estrada poeirenta.
Não irei além da contemplação dos trapezistas.

domingo, 24 de julho de 2011

Amy Winehouse (1983-2011)

Morreu aos 27 anos a cantora e compositora inglesa Amy Winehouse, e, mesmo sem a revelacao da causa-mortis, a suspeita óbvia recai sobre seu uso exagerado de alcool e outras drogas. A boa música está de luto, sentiremos falta de sua voz estranhamente linda, de suas letras mordazes e de sua figura agressivamente doce. Abaixo, uma das minhas preferidas. Na foto abaixo pode-se ver a transformacao que o uso pesado de drogas e alcoól fez nessa anti-musa da boa música universal.

Will You Still Love Me Tomorrow

Tonight you're mine completely                                     
You give your love so sweetly
Tonight the light of love is in your eyes
Will you still love me tomorrow?
Is this a lasting treasure
or just a moment pleasure?
Can I believe the magic of your sight?
Will you still love me tomorrow?
Tonight with words unspoken
You said that I'm the only one
But will my heart be broken
When the night meets the morning sun?
I like to know that your love
This know that I can be sure of
So tell me now cause I won't ask again
Will you still love me tomorrow?
Will you still love me tomorrow?
Will you still love me tomorrow?...

Para curtir a música no youtube clique aqui:
http://youtu.be/Ludxpkyrab0

quarta-feira, 29 de junho de 2011

LOPE DE VEGA

Lope Félix de Vega Carpio (1562-1635) nasceu em Madri, e era proveniente de uma família humilde. Muito cedo começou a estudar, em sua cidade natal e em Alcalá, tendo sido considerado um menino prodígio pelos seus mestres. Em sua desordenada vida particular combinou de forma simultânea e separadamente os papéis de amante, soldado, marido, secretario e sacerdote, além é claro de ter sido escritor em tempo integral.

Considerado o fundador da comédia espanhola, e um dos mais prolíficos escritores da literatura universal. Sua produção literária compõe-se de 426 comédias e 42 autos, além de milhares de poesias líricas, cartas, romances, poemas épicos e burlescos, livros religiosos e históricos, entre eles os extensos poemas como La Dragontea (1598) e La Gatomaquia (1634), os poemas curtos Rimas (1604), Rimas sacras (1614), Romancero Espiritual (1619) e a célebre écloga Amarilis (1633) - uma homenagem à amada morta. Ainda são destaques por sua originalidade, os épicos Jerusalén conquistada (1609), o Pastores de Belém (1612) e o romance dramático La Dorotea (1632).


Seus contemporâneos o chamaram de "Monstro da Natureza" por ter escrito mais de 1.500 peças de teatro. Entre elas destacam-se as inspiradas em histórias e lendas espanholas: O melhor juiz, o Rei; Peribánez e o Comendador de Ocaña; Fuenteovejuna; O cavaleiro de Olmedo. As históricas: O castigo sem vingança; Contra o valor não há infortúnio. As mitológicas: O pelego de ouro, Vênus. As comédias de costume: O aço de Madri; A dama boba.
Veja abaixo um dos poemas mais bonitos de Lope de Vega:


DESMAYARSE, ATREVERSE, ESTAR FURIOSO


Desmayarse, atreverse, estar furioso,
áspero, tierno, liberal, esquivo,
alentado, mortal, difunto, vivo,
leal, traidor, cobarde, animoso,

no hallar, fuera del bien, centro y reposo,
mostrarse alegre, triste, humilde, altivo,
enojado, valiente, fugitivo,
satisfecho, ofendido, receloso.

Huir el rostro al claro desengaño,
beber veneno por licor süave,
olvidar el provecho, amar el daño;

creer que un cielo en un infierno cabe,
dar la vida y el alma a un desengaño:
esto es amor. Quien lo probó lo sabe.


DEFINIÇÃO DO AMOR

Tradução de José Jeronymo Rivera

Desmaiar-se, atrever-se, estar furioso,
áspero, terno, liberal, esquivo,
alentado, mortal, defunto, vivo,
leal, traidor, covarde e valoroso;

não ver, fora do bem, centro e repouso,
mostrar-se alegre, triste, humilde, altivo,
enfadado, valente, fugitivo,
satisfeito, ofendido, receoso;

furtar o rosto ao claro desengano,
beber veneno qual licor suave,
esquecer o proveito, amar o dano;

acreditar que o céu no inferno cabe,
doar sua vida e alma a um desengano,
isto é amor; quem o provou bem sabe.

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Parece piada mas não é...

Como fazer fama e dinheiro como cientista



(Nota do Tradutor) - Quem, ao ler o texto abaixo, imaginar seu autor, ou como um lunático, ou como um ressentido, estará errando por muito. Ele descreve, através de um texto irônico, um estado de coisas implantado na comunidade científica mundo afora.

Desde que aos departamentos acadêmicos das universidades só importa o número de publicações de um determinado professor-pesquisador, ser um pesquisador famoso é equivalente a operar o milagre da multiplicação das publicações. Isso e muito mais é analisado e ensinado no texto que se segue.

Tudo isso acontece em países desenvolvidos onde a sociedade costuma ser mais atenta a fatos dessa natureza. A situação no Brasil é um muito pior, pois, falta-nos a tradição de uma instituição acadêmica que mereça esse nome. Lembremos que nossa primeira universidade foi criada, em 1920, para dar um título ao Rei da Bélgica. Além disso, com uma sociedade com baixo nível educacional, onde nossos intelectuais só promovem o desaprendizado daquela camada que sabe ler, nossas universidades se sentem livres para fabricar reputações ao sabor das modas. Somos famosos porque nos achamos famosos. Daí o pacto da mediocridade: fingimos que somos famosos e vocês fingem que acreditam. Fingem e, claro, nos financiam.


Parece que muitos de nossos cientistas não recebem um treinamento básico de como ter sucesso em ciência - por exemplo, como obter financiamento, como granjear o reconhecimento dos pares, como construir uma bibliografia maior que qualquer particular publicação nela listada. Para corrigir essa deficiência, são apresentadas a seguir algumas orientações. É claro que sempre haverá uma ovelha negra que decide embarcar num caminho inteiramente original ou que escolhe renunciar às benesses de ser reconhecido como um cientista famoso, caso para o qual essas orientações não se aplicam. No entanto, atenção aos princípios enunciados abaixo deve ser suficiente para proporcionar uma sólida base sobre a qual aspirantes a cientistas possam construir suas carreiras.

1. Relaxe! Afinal, estamos, no momento, entre duas alterações de paradigmas

Muito do stress e da ansiedade que tradicionalmente são associados com a atividade científica foi aliviado pelo tremendo insight de Thomas Kuhn. Como a grande maioria dos cientistas está atualmente fazendo ciência "normal", flutuando em águas teóricas, e avanços verdadeiros devem aguardar a próxima alteração de paradigma, muitos de nós podemos relaxar na medida em que percebemos que é improvável que nosso trabalho tenha uma influência duradoura. Há, é claro, aqueles que objetivam contribuir para, ou mesmo precipitar, uma alteração de paradigma, e é difícil que eles sejam dissuadidos de fazê-lo, mas o restante de nós deve reconhecer que o esclarecimento de um paradigma existente é necessário para a subseqüente revolução científica. Imagine como seria difícil a ciência se cada investigador fizesse alguma contribuição fundamental que envolvesse uma alteração de paradigma e nos forçasse a analisar as suposições básicas de nossa área de trabalho.

2. Torne-se Famoso

Uma vez que você tenha desenvolvido a atitude relaxada sobre a importância de seu próprio trabalho (item 1), torna-se muito mais fácil se dedicar a ser um cientista. Nesse particular, o ser famoso só perde em importância para o estar relaxado. Infelizmente, muitos cientistas subestimam a importância de ser famoso para ter sucesso em áreas como obter financiamento e conseguir viajar pelo mundo (item 5, abaixo). E ser famoso é realmente muito menos difícil que muitos imaginam. Há diversas opções. Uma das mais rápidas e garantida é trabalhar com alguém que já é famoso. Isso garantirá uma certa quantidade de fama secundária que poderá servir de fundamento para o estabelecimento de sua própria fama. Outro método é organizar uma conferência sobre um tópico "quente" e convidar para participar as pessoas mais famosas da área, incluindo a pessoa famosa com quem você trabalha. Em seguida inclua-se na conferência. Essa técnica tem tido resultados maravilhosos para incontáveis dos agora famosos cientistas. Outra opção efetiva é publicar um artigo ou abstract (resumo) toda semana na sua área de escolha. (item 3). Esse método demanda mais esforço, mas com atenção ao próximo item, o trabalho pode ser minimizado e os resultados certamente farão de você um reconhecido expert em qualquer área particular.

3. Publique Sempre (Preferencialmente Abstracts)

É conhecimento geral de que os cientistas modernos não têm tempo de ler a rapidamente crescente literatura de suas áreas e, com o reconhecimento de que a maior parte da pesquisa não terá efeito duradouro (item 1), seria mesmo uma perda de tempo tentar realizar tal tarefa. Portanto, aproveite-se do fato de que a maioria de seus pares será influenciada por seu trabalho através de reconhecimento de nome. O mesmo princípio que as agências de propaganda usam, ou seja, exposição repetida, é também vital para o sucesso em ciência. Quanto mais seu nome for visto impresso, maior influência você terá e mais famoso você será (item 2). A escolha do meio de divulgação é crítica; você deve publicar tanto quanto possível em jornais e revistas populares, mas revistas científicas têm também seu lugar. Você deve manter uma média de um artigo ou abstract por semana, e seu nome deve aparecer por último. Quanto mais co-autores você tiver, melhor, pois, todos sabem que o último autor é o verdadeiro, aquele que conta, e isso mostra que você já deve ser famoso por ter tantos cientistas trabalhando com você. Alguns argumentarão que cada publicação deve conter informação nova, mas, de novo, essa visão não leva em conta as lições aprendidas na Avenida Madison. De fato, quanto mais você diz a mesma coisa, maiores suas chances de ser lembrado. Uma vez que o mesmo conjunto de dados tenha sido publicado muitas vezes, com não mais que variações mínimas, elas começarão a ter grande credibilidade nas mentes de seus colegas e na sua própria. Além disso, sua área particular de trabalho, mesmo que previamente tida como obscura e desinteressante, ganha importância crescente toda vez que ela aparece impressa.

O formato pode ter um papel vital no seu sucesso definitivo. As muitas vantagens derivadas da publicação de seu trabalho, na forma de abstract, por exemplo, são freqüentemente subestimadas. Primeiramente, as publicações lhe proporcionam oportunidades de viagem (item 5). Em segundo lugar, elas raramente passam pelo processo de revisão para publicação (e todos nós temos verdadeiras estórias de horror sobre revisões críticas recebidas, mesmo relacionadas aos nossos melhores artigos). Em terceiro e mais importante lugar, as publicações proporcionam documentos que podem, ou ser citados no estabelecimento de precedência de uma observação, se ela estiver correta ou importante (ou ambas), ou podem ser facilmente deixadas de lado, se a observação se provar errada.

Em alguns casos, particularmente quando você já tiver alguma experiência, é possível publicar diversos abstracts ao mesmo tempo, cada um tratando de uma pequena variação sobre o mesmo tema. Algumas sociedades científicas permitem que você submeta apenas um abstract como primeiro autor, mas essa restrição pode facilmente ser superada. Muitos cientistas, por exemplo, já são cientes dos potenciais co-autores vindos de seus estudantes e associados, mas são freqüentemente subestimados os funcionários técnicos e administrativos, alguns dos quais ficariam satisfeitos de ver seus nomes impressos. Com um pouco de planejamento você pode ter diversos abstracts publicados simultaneamente, um com seu nome em primeiro lugar e o resto com seu nome listado por último. Conta a lenda que um cientista foi capaz de preencher duas sessões inteiras de um encontro científico com abstracts apenas de seu laboratório.

4. Publique Somente o Que Não Possa Ser Refutado (pelo Menos Durante sua Existência)

Muitos jovens cientistas tristemente interpretam erroneamente esse princípio como significando que os artigos a serem publicados devem ser trabalhados e concebidos cuidadosamente. Ao contrário, muito tempo e esforço podem ser economizados publicando-se resultados sem qualquer atenção à sua significância ou relevância. É provável que ninguém irá, afinal, ler o artigo (item 3), desta forma, não gaste seu precioso tempo analisando resultados. Ainda mais importante, desde que você restrinja sua discussão àquilo que você vê, com suficientes diferenças metodológicas de trabalhos prévios para que qualquer discrepância possa ser explicada se necessário, você nunca será flagrado em erro, particularmente se você se abstenha de discutir a significância potencial dos resultados. A maneira mais simples de evitar qualquer embaraço é publicar técnicas novas e aprimoradas. A publicação de métodos novos raramente levará você a grandes discussões teóricas com seus colegas, mas ainda lhe permite vivas discussões sobre se o PH era ótimo. Ainda mais recomendável, desenvolva um reagente que seus colegas possam usar e então o distribua a eles, com a modesta solicitação de que você seja incluído como autor de qualquer artigo que mencione o reagente. Você se surpreenderá o quão rapidamente sua bibliografia crescerá, juntamente com sua fama. Se, por alguma razão, você sinta obrigado a especular, por escrito, sobre seus resultados, limite sua especulação a idéias que não possam ser testadas, pelo menos durante sua existência.

5. Apresente Seu Trabalho em Toda Oportunidade

Um dos muitos benefícios de ser um cientista é viajar. Quanto mais famoso você é, mais oportunidades você terá de viajar. Da mesma forma, quanto mais você é visto em público, mais famoso você será. Além disso, cada conferência proporciona a oportunidade de publicar pelo menos um abstract (item 3). Quando apresentar seu trabalho, use slides atrativos, que não estejam cheios de detalhes. Uma dica importante: deixe de fora qualquer informação estatística, especialmente na forma de gráficos, pois, isso freqüentemente tira a atenção do ponto principal do slide. Contrariamente à situação de seu trabalho escrito, sinta-se livre para especular durante sua apresentação. De fato, não se sinta limitado pelos resultados. Lembre-se que seu impacto será muito maior se você fizer afirmações e generalizações amplas e radicais sem fundamentação no que você publicou no abstract. Se alguém lhe questionar seriamente alguma afirmação feita ou apresentar resultados contraditórios, você pode evitar qualquer embaraço alertando que ele ou ela não usou o PH ótimo.

As apresentações são necessárias, mas não suficientes, para a fama em ciência. Quando você for convidado a participar de um encontro científico, certifique-se de registrar quem o convidou, para que você seja capaz de convidar os mesmos indivíduos à próxima conferência que você organize. Com o tempo você descobrirá que existem suficientes pessoas para se convidarem mutuamente a diversas conferências ao ano e, se você for realmente famoso, poderá mesmo decidir estabelecer sua própria sociedade científica, consistindo de somente aqueles mais famosos cientistas (principalmente aqueles que você convidou para muitas conferências durante o ano).

6. Submeta uma Proposta de Financiamento Somente para o Trabalho que Você já Tenha Feito

Apesar disso ser uma coisa tão óbvia, há ainda cientistas, especialmente os principiantes, que solicitam financiamentos de experimentos que não estão ainda concluídos. Finalmente a maioria dos revisores de propostas de financiamento tem eliminado aqueles que continuamente propõem trabalhos inéditos, mas ainda há aqueles que têm dificuldade de entender que a aposta certa é no cavalo que já venceu. Naturalmente, você deve ser um pouco cuidadoso na publicação do trabalho proposto, de tal forma que ele não apareça impresso antes que sua proposta seja analisada (exceto, é claro, em forma de múltiplos abstracts). O cientista neófito pode se defrontar com o dilema de não ter sido capaz de realizar os experimentos antes de obter o suporte financeiro. A solução mais comum para isso é propor um trabalho similar ao que você já fez trabalhando com alguém famoso. Se essa opção não está disponível, então você será forçado a propor um trabalho que é original. Se for esse o caso, certifique-se de que a pesquisa é apenas uma pequena variação do trabalho já feito por alguém. Isso assegura aos revisores que seus experimentos particulares se encaixam no paradigma existente. Um bom exemplo seria encontrar o PH ótimo para a aplicação de um novo e aprimorado método.

7. Não Perca Tempo Dando Aulas

Lembre-se de que seu objetivo é fazer sucesso em ciência. Apesar de alguma experiência dando aulas ser benéfica, na medida em que o expõe aos estudantes que podem decidir trabalharem para você (e proporcionarem potenciais autores para muitos de seus abstracts), dar aulas consome muito tempo. Haverá alguma pressão de colegas e de seu chefe para que você contribua com o ensino, mas essa pressão pode ser aliviada de alguma forma, pela maneira com que você ensina. Por exemplo, sempre apresente seu material de forma a obscurecer qualquer relevância nos conteúdos que interessem aos estudantes. No ensino médico isso tem se tornado prática comum. Outro meio efetivo é oferecer detalhes sobre métodos que você usa no laboratório, especialmente enfatizando a importância do PH ótimo. Usualmente os estudantes estão tão sobrecarregados pelo volume de informações que eles terão dificuldade de formular perguntas inteligentes. A vantagem disso é óbvia. Com o tempo, menor carga de ensino será requerida de você e você terá mais tempo para escrever abstracts e ir a conferências.

8. Comercialize seu Produto

Fama é bom mas é muito melhor quando acompanhada de riqueza. O papel tradicional do cientista não tem sido tão lucrativo quanto outras carreiras. Isso está mudando. Uma das opções mais interessantes em ciência é identificar as aplicações comerciais potenciais de seu trabalho e comercializá-las. Numerosos cientistas estão descobrindo as vantagens financeiras de fundar suas próprias companhias com capital inicial provenientes de fundos governamentais de pesquisa e desenvolvimento. A beleza desse sistema é que há muito pouco risco. Se a aplicação comercial não gerar lucro, você pode sempre submeter uma proposta para um outro fundo governamental de pesquisa e continuar a vida. De outro lado, se você for capaz de capitalizar seu próprio sucesso científico e fundar uma lucrativa companhia, você pode usar suas afiliações acadêmicas, suas posições em corpos editoriais de publicações e de conferências, para manter-se a par dos mais recentes desenvolvimentos na área de estudo que alimenta sua companhia. A vantagem competitiva que isso dá a você é óbvia.

Resumo

A aderência a esses princípios não garantirá o sucesso, mas o testemunho de muitos cientistas famosos confirma a hipótese de que essas orientações podem fazer crescer significativamente.

Poucos cientistas sabem a história ilustrativa do abstract (resumo). A palavra é uma contração de "Abe’s Tract" (Tratado de Abe), que foi um panfleto pouco conhecido que Lincoln fez circular quando ele, pela primeira vez, disputou um cargo político. Apesar do conteúdo do panfleto não ser conhecido, sua influência dificilmente pode ser subestimada, pois a carreira subseqüente de Lincoln é considerada inteiramente derivada desse pequeno tratado. Alguns dizem que muitas idéias do tratado foram plagiadas de um trabalho não publicado de John Wilkes Booth, mas essa alegação nunca foi consubstanciada.

© 2003 MidiaSemMascara.org
(Publicado em Perspectives in Biol. and Med., 34:2 Winter 1991, 213-218)
por Redação MSM em 04 de novembro de 2003

Resumo: Por Keith A. Crutcher, com tradução de Antônio Emílio de Araújo para o MSM (4/11)

sexta-feira, 27 de maio de 2011

Bruna Lombardi

Melodrama


Eu sou uma mulher espantada

o amor me molha toda

me deixa com dor nas costas

ele diz no fundo gostas

no fundo ele tem razão



o amor tinha de ser

mais uma contradição

tinha de ser verdadeiro

confuso e biscateiro

como em toda situação



tinha de ter remorso

e um querer e não posso

e toda essa aflição

tinha de me dar pancada

e eu cantar não dói nem nada

com um radinho na mão



tinha de fazer ameça

que é pra poder ter mais graça

como toda relação

tinha de ser dolorido



rasgar um pouco o meu vestido

depois me pedir perdão

e como em todo melodrama

terminar na minha cama

até por falta de opção.




quarta-feira, 25 de maio de 2011

Petrúcio Amorim

Esse poeta pernambucano foi praticamente meu vizinho; infelizmente não o conheci, pois aos treze anos de idade deixei Caruaru e vim pras Alagoas. Soube que ele morava no bairro do Vassoural, perto da marcenaria de Mestre Osvaldo, e, perto da casa de meus avós maternos, Dona Santa e Seu Damião. E tudo no meio da ladeira do Vassoural, pertinho do Colégio Industrial, em que minha irmã e minhas primas estudaram, e meu padrinho Leobino era professor. Eu nasci no Vassoural e me criei em seus becos, e por tudo isso a poesia de Petrúcio me toca fundo na alma, mas, você pode ter nascido em Viena, que dá no mesmo... Petrúcio é universal!

ANJO MALANDRINHO

Tanto tempo faz
Que eu não me apaixono
Faz tempo que ninguém
Me chama de amor
Carente solitário
Coração sem dono
Parece até gostar
De enganar a dor
Um riacho vazio
Correndo no peito
E ninguém dava jeito
Nesse meu viver
Mas eis que de repente
Pelo meu caminho
Um anjo malandrinho
Me trouxe você
Pra me botar no colo
E me fazer loucura
Provar toda doçura
Que tem a paixão
Ouvir as estrelas
Até faz sentido
Acordar com teu ouvido
No meu coração

Trazer pra minha vida
Toda alegria
Meu ouro minha guia
Meu entardecer
Felicidade agora
Achou meu endereço
Que bom que eu mereço
Estar com você

Manoel de Barros

Uma Didática da Invenção


do "O Livro das Ignoranças" ed. Civilização Brasileira.

I

Para apalpar as intimidades do mundo é preciso saber:

a) Que o esplendor da manhã não se abre com

faca

b) 0 modo como as violetas preparam o dia

para morrer

c) Por que é que as borboletas de tarjas

vermelhas têm devoção por túmulos

d) Se o homem que toca de tarde sua existência

num fagote, tem salvação

e) Que um rio que flui entre 2 jacintos carrega

mais ternura que um rio que flui entre 2

lagartos

f) Como pegar na voz de um peixe

g) Qual o lado da noite que umedece primeiro.

Etc.

etc.

etc.

Desaprender 8 horas por dia ensina os princípios.



IV

No Tratado das Grandezas do Ínfimo estava

escrito:

Poesia é quando a tarde está competente para

Dálias.

É quando

Ao lado de um pardal o dia dorme antes.

Quando o homem faz sua primeira lagartixa

É quando um trevo assume a noite

E um sapo engole as auroras



IX

Para entrar em estado de árvore é preciso

partir de um torpor animal de lagarto às

3 horas da tarde, no mês de agosto.

Em 2 anos a inércia e o mato vão crescer

em nossa boca.

Sofreremos alguma decomposição lírica até

o mato sair na voz.

Hoje eu desenho o cheiro das árvores.


IX

O rio que fazia uma volta atrás de nossa casa

era a imagem de um vidro mole que fazia uma

volta atrás de casa.

Passou um homem depois e disse: Essa volta

que o rio faz por trás de sua casa se chama

enseada.

Não era mais a imagem de uma cobra de vidro

que fazia uma volta atrás de casa.

Era uma enseada.

Acho que o nome empobreceu a imagem.

sábado, 30 de abril de 2011

LEDO IVO - A queimada!


Lêdo Ivo nasceu em Maceió, em 1924 e após uma estada de pouco mais que um ano no Recife (das mais importantes para sua formação literária), muda-se para o Rio de Janeiro (1943) onde vive até hoje.


Poesia: Ode e elegia, Acontecimento do soneto, Ode ao crepúsculo, Cântico, Linguagem, Um brasileiro em Paris, Magias, Estação central, Finisterra, O soldado raso, A noite misteriosa.

Romance: As alianças, O caminho sem aventura, O sobrinho do general e Ninho de cobras.

Ensaios: O universo poético de Raul Pompéia, Poesia observada, Ladrão de flor, Teoria e celebração e Ética da aventura.

Crônicas: A cidade e os dias e a autobiografia Confissões de um poeta. Tradução: Uma temporada no inferno e Iluminações, de Rimbaud.

Sobre a importância da formação cultural do poeta (entrevista dada a Cláudio Aguiar, Jornal de Poesia):

“De modo que eu tive uma formação cultural muito importante, o que me leva a pensar que a formação poética é mais um efeito da cultura do que só da sensibilidade. Só a cultura literária permite a expressão daquilo que o escritor gostaria de dizer. Daí que não levo em boa conta as pessoas que privilegiam apenas a instintividade ou até a ignorância. Eu acho que é da tradição da literatura ocidental reconhecer os poetas como pessoas cultas”.

A Queimada

Queime tudo o que puder:

as cartas de amor

as contas telefônicas

o rol de roupas sujas

as escrituras e certidões

as inconfidências dos confrades ressentidos

a confissão interrompida

o poema erótico que ratifica a impotência

e anuncia a arteriosclerose

os recortes antigos e as fotografias amareladas.

Não deixe aos herdeiros esfaimados

nenhuma herança de papel.

Seja como os lobos: more num covil

e só mostre à canalha das ruas os seus dentes afiados.

Viva e morra fechado como um caracol.

Diga sempre não à escória eletrônica.

Destrua os poemas inacabados, os rascunhos,

as variantes e os fragmentos

que provocam o orgasmo tardio dos filólogos e escoliastas.

Não deixe aos catadores do lixo literário nenhuma migalha.

Não confie a ninguém o seu segredo.

A verdade não pode ser dita.

sábado, 9 de abril de 2011

PSICÓTICO OU PSICOPATA? A tragédia do Rio.

Na última quinta-feira o Brasil foi abalado pela tragédia acontecida na Escola Municipal Tasso da Silveira, no bairro do Realengo no Rio de Janeiro. O atirador Wellington Menezes, matou onze crianças, e depois de baleado por um policial militar, cometeu suicídio. Comoção nacional. O Brasil inteiro sentiu o impacto causado por nossa fragilidade em cuidar de nossas crianças e jovens. Até a presidenta, que para mim era mais fria que um iceberg, chorou ao se referir aos "brasileirinhos" mortos pelo criminoso.
Aí a imprensa vai procurar os especialistas para tentar entender os motivos do crime. Psicólogos, psiquiatras, sociólogos e criminalistas opinam sobre a motivação e sobre o quadro psicopatólogico do atirador.
Será um psicopata? Um sociopata, talvez?  Será que a carta encontrada no bolso do assassino pode esclarecer o ocorrido?
Sem dúvida, a carta, o depoimento de parentes e amigos do atirador podem nos dar pistas.
Em primeiro lugar: psicopatas não cometem crimes para se suicidar em seguida; logo, não se trata de um psicopata. E nem de um caso de vítima de "bulling", não foi por vingança tardia, mesmo que afirmem que ele havia sofrido molestação em seus tempos de estudante, pois não se espera mais de dez anos para realização da vingança. Aqui não foi semelhante a Columbine.
Pelo que tudo indica, o crime foi motivado por um surto psicótico, que já se delineara havia algum tempo e culminou na tragédia.
Resta-nos agora procurar os culpados, pois, do assassino já sabemos a motivação. Quem vendeu a arma? O vigilante disse que se soubesse para que seria usada não venderia. Isso é resposta? Quem quer uma arma só a quer para um único motivo: matar.
É hora de parar com a hipocrisia, armas de fogo foram feitas para matar, quem vende é tão culpado quanto aquele que a usou.
Wellington era psicótico, sua ação tem todas as formas de um delírio; mas, quem pôs as armas em suas mãos, fez mais do que um negócio financeiro, armou as mãos de um psicótico que sem elas não cometeria a maior tragédia escolar do país.
E o vigia Izaías, que vendeu a arma, ainda disse: se eu soubesse para que seria usada não faria isso.
Para que se usam armas de fogo?
Para promover a vida é que não é.

terça-feira, 8 de março de 2011

Síndrome da Morte Súbita em bebês

Ontem, 7 de Março, segunda-feira de carnaval, fui acordado com a triste notícia de que o bebê de 3 meses, filha de um casal conhecido havia morrido.
A pequena Lívia que passara o domingo no play-ground do condomínio ao lado da mãe de seus dois irmãos pequenos, depois de ser colocada em seu berço não mais acordou.
O desespero da mãe ao ver que a filha não se movia comoveu a todos que presenciaram o triste acontecimento. O pai, inconformado, os avós, tios e amigos a se perguntar: porquê?
Os pais não devem sepultar seus filhos. A morte de crianças vem contrariar com um peso incomensurável essa assertiva que deveria ser verdadeira.
Infelizmente não é.
E a pergunta que todos nos fazemos - porquê - vai continuar sem resposta.
Com relação à SMS em lactentes ainda não se sabe as causas. Conhece-se as estatísticas (1 em 1000), sabe-se que o fenômeno é crescente no mundo todo, mas, não mais que isso.
Resta-nos pedir a Deus que fortaleça essa família, dando-lhes a força necessária para continuar sobrevivendo apesar da tragédia.
Para maiores esclarecimentos sobre a SMSL recomendamos o link abaixo:

http://br.guiainfantil.com/saude/204-morte-subita/386-morte-subita-dos-bebes.html

domingo, 27 de fevereiro de 2011

FELICIDADE

Certa vez Freud escreveu que aqueles que mais se aproximaram ao âmago das questões suscitadas pela alma humana, foram os Poetas... Que segundo o poeta Manoel de Barros "arejam as palavras" como as minhocas fazem com a terra. Nada mais verdadeiro, como se vê nessa bela "definição" de felicidade, nesse soneto do poeta Vicente de Carvalho:

FELICIDADE

Só a leve esperança, em toda a vida,
Disfarça a pena de viver, mais nada:
Nem é mais a existência, resumida,
Que uma grande esperança malograda.

O eterno sonho da alma desterrada,
Sonho que a traz ansiosa e embevecida,
É uma hora feliz, sempre adiada
E que não chega nunca em toda a vida.

Essa felicidade que supomos,
Árvore milagrosa, que sonhamos
Toda arreada de dourados pomos,

Existe, sim: mas nós não a alcançamos
Porque está sempre apenas onde a pomos
E nunca a pomos onde nós estamos.

sábado, 19 de fevereiro de 2011

O SIGNIFICANTE - Roland Chemama

Significante, s. m. (alem.: Signifikant, fr.: significant; in. signifier). Elemento do discurso, referível tanto ao nível consciente como inconsciente, que representa e determina o sujeito.
Tornou-se evidente, a partir de S. Freud, que a psicanálise é uma experiência da palavra, o que exige um reexame do campo da linguagem e de seus elementos constitutivos, os significantes.

O tratamento das primeiras histéricas, conduzido por J. Breuer ou S. Freud, já destacava esse traço, a verbalização, sem dúvida, mais importante do que até mesmo a “tomada de consciência”. É por ter podido dizer aquilo que jamais havia conseguido enunciar que a histérica se cura. Foi uma delas, Anna O, quem chamou o tratamento de “Talking Cure”, ou seja, tratamento pela palavra. Isso é, aliás, esclarecedor para a própria etiologia da neurose: na histeria, o que é patogênico não é o trauma (por exemplo, ter visto um cão beber água em um copo, o que teria suscitado um intenso desagrado), é não ter conseguido verbalizar esse desagrado. No lugar da verbalização surgiu o sintoma, que irá desaparecer quando o sujeito conseguir dizer o que o estava afetando.

A evolução ulterior da psicanálise acentua ainda mais o papel da palavra e exige uma atenção mais precisa à linguagem.

Como o método psicanalítico leva em conta, de fato, mais a atualização dos conflitos latentes do que a rememoração direta de lembranças patogênicas, ele passa a se interessar, em particular pelas formações do inconsciente, nas quais esses conflitos são representados. Ora, estes são regulados por seqüências rigorosas de linguagem. Este é o caso do lapso, do esquecimento e, em geral, do ato falho, que consegue expressar um desejo, de forma alusiva, metafórica ou metonímica. É o caso também do chiste, que consegue dar a entender aquilo que é proibido, enganando, desse modo a censura. Finalmente, este também é o caso do sonho, cuja a narrativa se lê como um texto complexo, que exige uma atenção bastante precisa dos próprios termos que o compõem.

Coube a Lacan sistematizar toda essa problemática, recentrando-a sobre o conceito de significante.

O termo significante foi tirado da lingüística. Em Saussure, o signo lingüístico é uma entidade psíquica de duas faces: por exemplo, o significado ou conceito da palavra árvore é a idéia de árvore e não o referencial, a árvore real, e o significante, igualmente realidade psíquica, pois se trata não do som material que se produz quando se pronuncia a palavra árvore, mas da imagem acústica desse som, que se pode ter na cabeça quando, por exemplo, declama-se uma poesia sem pronunciá-la em voz alta.

A AUTONOMIA DO SIGNIFICANTE

Lacan retoma, transformando-o, o conceito saussureano do significante.

Em primeiro lugar, o que a psicanálise enfatiza é a autonomia do significante. Como na lingüística, no sentido analítico o significante é separado do referencial, mas é igualmente definível além de qualquer relação com o significado, pelo menos em um primeiro momento. O jogo sobre os fonemas, cujo valor é totalmente essencial nas crianças, demonstra a importância que a linguagem possui para o ser humano, antes de qualquer intenção de significar. Por outro lado, a psicose é uma outra ocasião para se apreender, de uma forma direta, o que seria um significante sem significação, um significante assemântico. A frase que o psicótico escuta, em sua alucinação, visa a ele, refere-se a ele, impõe-se a ele. Mas, por não poder ser relacionada com uma outra, de fato, não possui uma verdadeira significação.

Entretanto, além dessas referências particulares à infância ou à psicose, é para todo sujeito que se deve acentuar a distinção entre significante e significado.

O que o algoritmo lacaniano

S ( Significante)

s significado

permite escrever, é a existência de uma barra que afeta o sujeito humano, em virtude da existência da linguagem, e que faz com que, falando, ele não saiba o que está dizendo.

Assim, em Freud, o Homem dos ratos foi subitamente tomado pelo impulso de emagrecer. Porém, esse impulso continua incompreensível, enquanto não for revelado que a palavra “gordo”, na língua que estava então falando, o alemão, diz-se “dick”, sendo também Dick o nome de um rival, de quem gostaria de se desfazer. Emagrecer seria matar o rival, Dick. Pode-se ver o alcance desse tipo de observação. No limite, a própria possibilidade do inconsciente é condicionada pelo fato de que um significante pode insistir no discurso de um sujeito, sem por isso está associado à significação que poderia importar, para ele. “A linguagem é a condição do inconsciente.”

Da mesma forma, o sintoma, que diz alguma coisa de maneira indireta, inaudível, pode ser considerado como o significante de um significado inacessível para o sujeito.

A CADEIA SIGNIFICANTE

Se o significante for concebido como autônomo em relação à significação, ele irá, portanto, assumir uma função completamente diferente da de significar: a de representar o sujeito e também a de determiná-lo.

Tomemos um exemplo simples. Um homossexual confessa espontaneamente sua preferência por jovens de um certo estilo, de uma certa idade, que, para ele, seriam mais bem descritos pela expressão “les p’tits soldats” (os pequenos soldados). Ora, a imagem levaria à lembrança de uma grande harmonia com sua mãe, lembrança essa cristalizada em torno da recordação das tardes de verão, nas quais, após longos passeios, ela o levava ao café e pedia> “ah, poru lui, um p’tit soda” (ah, para ele uma soda pequena). Evidentemente, esse tipo de lembrança não implica que, de acordo com a psicanálise, tudo na vida seja esclarecido pela recordação de algumas palavras escutadas na infância. Porém, isso ajuda a caracterizar, no sujeito humano, a função do significante. A forma como esse homem nomeia o objeto do seu desejo, e, portanto, determina seus traços, nada mais faz do que remetê-lo a um significante ouvido na infância, que tanto mais irá insistir quanto menos for reconhecido como tal. Segundo a fórmula de Lacan, “um significante é aquilo que representa o sujeito para um outro significante”. No caso, também se deve observar que o que conta, no “soldado”, não é sua significação, em relação, por exemplo, à vida militar, mas sua significância, isto é, aquilo que é produzido diretamente pela própria imagem acústica da palavra.

Por outro lado, já se havia constatado, pelo exemplo relacionado com Dick, o lugar do jogo de palavras na função do significante. Esse lugar é dado pelo fato de que aquilo que representa, não é a palavra, mas precisamente o significante, isto é, uma seqüência acústica que pode assumir diferentes sentidos. A obra de Freud fornece em profusão os mais diversos exemplos. Como o caso da histérica, tratada nos primeiros tempos da psicanálise, que sofria de uma dor em verruma na fronte, dor que desapareceu no dia em que ela conseguiu lembrar-se de sua avó, muito desconfiada, que a olhava com um olhar “penetrante”. Neste caso as coisas continuariam sendo incompreensíveis, se não tivesse havido a referência ao duplo sentido da palavra “penetrante”, o sentido “literal” e o sentido do “figurado”.

Além disso, é fácil conceber que tais significantes, que se associam e se repetem sem qualquer controle do eu, que se ordenam em cadeias determinadas com rigor, da mesma forma como a gramática determina a ordem da frase, revelam-se, ao mesmo tempo, totalmente constrangedores para o sujeito humano. No caso, a questão do significante remete à da repetição: retorno regular de expressões, de seqüências fonéticas, de simples letras que escondem a vida do sujeito, prontas a mudar de sentido a cada vez que ocorrem, que insistem sem qualquer significação definida.

Um dos exemplos mais conhecidos a esse respeito, continua sendo o Homem dos lobos. Freud, e, mais tarde, vários analistas, que retomara a narrativa de seu tratamento, destacaram a insistência de um mesmo símbolo, representado pela letra (V maiúsculo) ou um algarismo (cinco romano). Sob esta última forma, ele remete às crises depressivas ou febris que tivera em sua infância, na quinta hora da tarde, hora também de uma cena primitiva (teria visto seus pais fazerem amor no momento em que os ponteiros do relógio estariam apontando para o V). Sob forma de letra (V ou W), retorna regularmente, nas inicial de nomes próprios de diversos personagens com os quais estivera freqüentemente em conflito; ou então simboliza a castração, em um sonho no qual são arrancadas as assas de uma vespa (Wespe, mas ele diz “espe”, o ainda S. P., suas iniciais). Finalmente, em sua forma gráfica, o V invertido representa as orelhas erguidas dos lobos, que passaram a designar para a posteridade esse célebre paciente de Freud.

ALCANCES E LIMITES DAS REFERÊNCIAS À LINGÜÍSTICA

O termo significante é considerado essencial para a elaboração psicanalítica. Portanto, pode-se indagar que traços conserva com sua origem lingüística.

As referências, explícitas ou implícitas, continuam sendo numerosas em Lacan. Elas se referem principalmente à dimensão estrutural de linguagem, introduzida por Saussure; mas sem dúvida vão muito além. Seria conveniente observar que, em especial na época em que a lingüística pragmática passou a ocupar um lugar não negligenciável entre as ciências humanas, a concepção lacaniana do significante considera, desde o início, a dimensão de ato existente na linguagem. O significante não é apenas um efeito de sentido. Ele comanda ou pacifica, adormece ou desperta.

Talvez fosse ainda mais importante do que a referência à lingüística, a referência que podemos fazer à poética. Como o poeta, o analista está atento às diversas conotações do significante, que ampliam as possibilidade da interpretação.

Afinal de contas, seria ainda o significante assimilável à imagem acústica? Em todo caso, para Lacan, não é esta sua definição. Evidentemente, enquanto oposto à significação, o significante é identificado, na maioria das vezes, como uma seqüência fonemática. Porém, também pode ser às vezes, completamente diferente. Assim, Lacan o faz surgir como significante, na primeira censa de Athalie, “o temor a Deus”. Essa expressão não deve ser tomada no nível da significação, ao menos aparente, pois “aquilo que se chama temor a Deus [...] é o contrário de um temor”. Porém, se ela for designada como significante, o é antes de mais nada porque, mais do que os outros termos, possui um efeito sobre a significação e sobre um dos personagens da peça, Abner, que ela comanda e traz consigo. Esse último exemplo marca muito bem como é que, a partir de seu efeito de sentido, e sobretudo do papel que eles representam em uma economia subjetiva, os elementos dos discurso podem assumir o valor de significantes.

CHEMAMA, Roland. Dicionário de psicanálise. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1995. p. 197-9.

domingo, 30 de janeiro de 2011

Profetas contemporâneos: desafios para a missão de um pastor.

Waldir Martins

A tarefa de ser pastor nunca foi fácil de ser desenvolvida, inclusive se considerarmos a percepção negativa que muitos têm a nosso respeito. Particularmente, vivo às “turras” com a missão que recebi. Desenvolvo-a de forma visceral há mais de 15 anos, mas não há um dia que em que eu não tenha sérios questionamentos quanto a essa missão.

O ministério pastoral é e deve ser compreendido como um chamado divino. Talvez por essa razão, suas funções, a despeito de bem humanas, têm alcance inimaginável. Nós não temos a noção exata do impacto das nossas palavras na vida das pessoas que nos ouvem com as mais diversas expectativas e necessidades. Por mais que queiramos dessacralizar a nossa atuação, e o nosso discurso, para muitos, ouvir um pastor, um padre ou outra liderança religiosa é muito diferente de ouvir um professor, um sociólogo ou um filósofo, por exemplo.

Ainda assim, convivemos com um imaginário multifacetado sobre a figura do pastor. Provavelmente, se perguntarmos para diferentes pessoas ou grupos, cada um deles deverá manifestar uma visão diversa sobre o papel de um pastor. Mas, a despeito desse olhar geral da sociedade, penso que cada pastor deve ter a sua própria percepção da missão que recebeu do Senhor, para não capitular diante de tantos olhares divergentes sobre a sua própria figura. E aqui vão alguns deles: um mercenário, que vive para explorar o dinheiro e a boa fé das pessoas. Ou um vendedor de ilusões, um charlatão que faz pouco caso da fé das pessoas. Ou, ainda, alguém que vive regaladamente, um aproveitador da miséria dos outros, vivendo um padrão de vida sempre superior ao dos seus fiéis.

Aqui pagamos o preço da generalização do tipo de “evangélico” que predomina no Brasil, o que contribui para a consolidação daqueles estereótipos de um pastor. Isso porque, lamentavelmente, muitas igrejas existem e têm como estratégia de crescimento a dilapidação do patrimônio das pessoas – para muitos, “o dinheiro da igreja vai mesmo para o bolso do pastor”.

Além dessas percepções, acrescento o olhar da própria igreja, nem sempre muito generoso. O pastor pode ser o “Anjo da igreja”, sempre amoroso, paciente, comedido nas suas palavras. Pode ainda ser o pregador, administrador, visitador, enfim, alguém com aptidão para qualquer demanda que seja. Ele pode ser até um “Super – homem” que nunca fica triste, está sempre pronto para o que der e vier, com um sorriso nos lábios, de preferência.

Sem querer generalizar, a igreja tende a olhar o seu pastor para além da sua humanidade. Às vezes, esquece-se que ali, por trás daquele sujeito aparentemente imbatível, há alguém que precisa de solidariedade, de compreensão. Alguém tão “gente” quanto qualquer outra pessoa. Às vezes até um “meninão” em alguns aspectos da vida. Mas o grande problema não é a igreja olhá-lo dessa forma, mas ele aceitar ser o “anjo” da igreja, ser o “super-homem” e subir nesse pedestal...

O olhar do pastor sobre si mesmo também precisa ser aqui considerado: pode torná-lo intolerante, muito exigente consigo e com os seus familiares, com extrema dificuldade de dizer não e de assumir seus limites e seus pecados. E é uma grande tarefa nos livrarmos desses olhares denunciantes de nós para nós mesmos, sem querer responder de uma forma ou de outra, o que dificulta percebermos em que realmente consiste a missão do pastor nos dias de hoje.

Quando lembro da imagem do Senhor Jesus conversando com Pedro, questionando-lhe sobre o seu amor e mandando-o pastorear a suas ovelhas, ( João 21:17ss), me vem à mente a imagem do pastor como aquele que cuida do seu rebanho, entendendo aqui o cuidado como a imersão na alma da sua comunidade. Gosto de lembrar o Rubem Alves dizendo que não precisamos convencer as pessoas com as nossas verdades, mas seduzí-las. Ele dizia: primeiro ganhe o coração das pessoas depois a razão aparece... As pessoas vão gostar de você antes de concordar com as suas idéias. Ninguém resiste, num momento de dor, à simbólica presença do pastor num hospital ou numa visita domiciliar. A sensação é a de que todas as divergências vão por água abaixo quando o pastor é pastor para alguém que precisa de um pastor. Embora seja certo que, às vezes, a burocracia de uma igreja rouba do pastor a oportunidade de exercer a essência da sua missão, que é o cuidado com as pessoas.

Além disso, o pastor deve ser alguém devidamente sintonizado com o seu tempo, deve praticar a leitura da realidade que o cerca. Não acho que ele deva dominar todas as novas tecnologias, mas ter a capacidade de entender os valores que dominam os seus dias; deve saber da importância da política, e da importância política do seu papel; deve entender como as forças do capital dominam e escravizam milhares e milhares de vidas que não têm voz e nem quem fale por elas; deve assumir que o poder político em mãos inescrupulosas precisa ser denunciado, mas não deve jamais permitir que seu ministério seja utilizado nem pela direita nem pela esquerda sob quaisquer pretextos. O pastor deve entender-se como o homem ou a mulher de Deus vivendo hoje com a responsabilidade de pastorear um rebanho e, dentro das suas limitações, ajudar a livrá-los dos lobos ferozes que se apresentam em peles de cordeiro.

Entendo também que o pastor deve prosseguir na busca pela identificação com as pessoas, e não ser apenas um intelectual, alguém que fala bonito sobre os pobres ou sobre a pobreza, mas que tenha identidade com eles. E se você conhece pastores que lucram para se manterem em silêncio diante de injustiças, saiba que temos exemplos daqueles com coragem profética, que não mediram esforços para serem fiéis testemunhas, mártires em nome do evangelho da justiça.

Trago à memória dois pastores, em particular: o luterano Dietrich Bonhoeffer, que em nome do seu compromisso radical com o Senhor Jesus e o amor ao seu povo, enfrenta o regime de Hitler, é preso e enforcado pouco tempo antes da vitória dos aliados. Outro exemplo é o do bispo Oscar Romero, de El Salvador, assassinado como represália à sua atuação profética em favor do povo salvadorenho.

Mas aproveito a ocasião para trazer algumas palavras daquele que ficou conhecido como o “profeta do Araguaia” e também primoroso poeta, D. Pedro Casaldáliga. Bispo em São Félix do Araguaia, no Mato Grosso, por 35 anos, ali desenvolveu seu ministério, profundamente comprometido com a causa dos pobres, dos indígenas, dos posseiros, dos peões, mantendo sua igreja humilde, simples, aberta e acolhedora.

Ao realizar uma palestra na Universidade Católica de Goiânia, falando sobre o profetismo na igreja, ele afirmou que: “profeta é aquele que tem a acuidade necessária para ver e para ouvir a Deus; para ver e ouvir os homens. Para interpretá-los: os homens e a Deus. O profeta é um inconformado com a situação de pecado e de injustiça que aí está. É um inseguro e sente medo, porque sabe o quanto arrisca. É um radical, porque vê o “novo” de Deus e conclama à novidade de Deus. Sua palavra – como o dabar bíblico – não é somente palavra dita; é atitude, gesto, prática. Palavra que não se cumpre não é palavra de Deus.”

Em outra ocasião, numa entrevista quando da sua renúncia ao bispado por completar 75 anos, o repórter lhe pergunta: “Depois de 35 anos na região, o senhor é feliz?”. D. Pedro responde: “Eu tenho paz. Aquela paz do Evangelho. Uma paz diferente. Agora eu vivo com amargura da impotência frente a esse mundo injusto, frente à prepotência dos grandes, seja dos impérios, seja das oligarquias. Essa situação de fome, de violência e guerra preventiva que acabam de inventar. Estava lendo agora uma mensagem de um companheiro, que é diretor de Justiça e Paz da nossa congregação. E ele se pergunta se pode celebrar o Natal. É evidente que sim, mas celebrar com uma espécie de revolta evangélica, frente a tanta iniquidade. Agora, estou feliz porque tenho esperança. Perguntou-me uma revista: "Você é alegre?". Respondi, recordando um verso de Cecília Meireles: "Não sou alegre nem sou triste: sou poeta!". Mas, eu concluí dizendo que a minha alegria se chama esperança. Às vezes, como dizia São Paulo, uma esperança contra toda a esperança, mas se é esperança, não falha”.

Enfim, por mais humana que seja a nossa tarefa, há um quê de divino naquilo que fazemos. No exercício do ministério pastoral passamos a ter algumas permissões para entrar em domínios na vida das pessoas, que não são permitidos a outros profissionais. Passamos a ter acesso a informações ou confissões que nem mesmo o psicólogo ou o psiquiatra da pessoa terão.. Daí a responsabilidade que paira sobre nós, reles mortais com a missão de pastorear.

Se posso recomendar algo a um colega pastor, eu diria que desenvolva a sensibilidade no trato com as pessoas; estabeleça o diálogo com a comunidade e tenha como propósitos da vida servir a Deus servindo as pessoas, e servir as pessoas servindo a Deus.

Talvez, no final das contas, o que todos nós precisamos é ouvir do Senhor as palavras que Jesus ouviu quando do seu batismo e início do ministério: “Este é o meu filho amado, em que me comprazo” (Mateus 3:17). Penso que, com isso, todos os demais olhares da sociedade, da igreja, além do seu próprio olhar serão relativizados pelo simples olhar do Senhor que diz: “Tu és o meu filho amado”.

Notas:

[1] Esta Reflexão foi apresentada no culto de posse do Pr. Moisés Alves, na Igreja Batista Nazareth, em 26/12/10.
[2] A entrevista concedida por D. Pedro Casaldáliga está disponível em: http://www.pime.org.br/mundoemissao/testemunhosbispo.htm.

Referências:

Aguirre. Pe. Luis Pérez. Homilia no segundo aniversário do martírio de D. Oscar Romero. In: Sinais de vida e fidelidade. Testemunhos da Igreja na américa Latina (1978 - 1982). São Paulo: Edições Paulinas: 1986.
Bonhoeffer, Dietrich. Tentação. São Leopoldo: Editora Sinodal, 1983.
Casaldáliga, Pedro. Na procura do Reino: antologia de textos, 1968-1988. São Paulo: Editora FTD, 1988.

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

CHARLES BUKOWSKY

A Love Poem


todas as mulheres

todos os beijos as

diferentes formas que amam e

falam e carecem.

suas orelhas todas elas têm

orelhas e

gargantas e vestidos

e sapatos e

automóveis e ex-

maridos.

na maioria das vezes

as mulheres são muito

quentes elas me lembram

torrada com a manteiga

derretida

nela.

está estampado no

olhar: elas foram

tomadas elas foram

enganadas. eu nunca sei o que

fazer por

elas.

sou

um bom cozinheiro um bom

ouvinte

mas nunca aprendi a

dançar — eu estava ocupado

com coisas maiores.

mas eu apreciei suas variadas

camas

fumando cigarros

olhando para o

teto. não fui nocivo nem

desleal. apenas

um aprendiz.

eu sei que todas têm

pés e descalças elas andam pelo piso enquanto

eu olho suas modestas bundas no

escuro. sei que gostam de mim, algumas até

me amam

mas eu amo muito

poucas.

algumas me dão laranjas e vitaminas;

outras falam mansamente da

infância e pais e

paisagens; algumas são quase

loucas mas nenhuma delas deixa de fazer

sentido; algumas amam

bem, outras nem

tanto; as melhores no sexo nem sempre são as

melhores em outras

coisas; cada uma tem seus limites como eu tenho

limites e nós aprendemos

cada qual

rapidamente.

todas as mulheres todas as

mulheres todos os

quartos

os tapetes as

fotos as

cortinas, é

algo como uma igreja

raramente se ouve

uma risada.

essas orelhas esses

braços esses

cotovelos esses olhos

olhando, o afeto

e a carência eu tenho

agüentado eu tenho

agüentado.