quinta-feira, 24 de abril de 2008

TESE DE GUERDJEF

Esta é a tese do pensador russo chamado GUERDJEF que no início do século passado já falava em auto conhecimento e da importância de se saber viver bem. Dizia ele: “Uma boa vida tem como base o sentido do que queremos para nós em cada momento, e daquilo que realmente vale como principal”. No Instituto Francês de Ansiedade e Stress (Paris), foram colocadas em destaque, 20 regras de vida que Guerdjef traçou. Dizem os “experts” em comportamento que, que já consegue assimilar 10 delas, com certeza aprendeu a viver com melhor qualidade interior.

1 - Faça pausas de dez minutos a cada duas horas de trabalho, no máximo. Repita essas pausas na vida diária e pense em você, converse com alguém e analise suas atitudes.
2 - Aprenda a dizer não sem se sentir culpado ou achar que magoou. Querer agradar a todos é um desgaste enorme.
3 - Planeje seu dia, sim, mas deixe sempre um bom espaço para o improviso, consciente de que nem tudo depende de você.
4 - Concentre-se em apenas uma tarefa de cada vez. Por mais ágeis que sejam os seus quadros mentais, você se exaure.
5 - Pare de pensar, de uma vez por todas, que você é imprescindível. No trabalho, em casa, no grupo habitual. Por mais que isso lhe desagrade, tudo anda sem a sua atuação, a não ser você mesmo.
6 - Abra mão de ser o responsável pelo prazer de todos. Você não é a fonte dos desejos, o eterno mestre de cerimônias.
7 - Peça ajuda sempre que necessário, tendo o bom senso de pedir às pessoas certas.
8 - Diferencie problemas reais de problemas imaginários e elimine-os porque são pura perda de tempo e ocupam um espaço mental precioso para coisas mais importantes.
9 - Tente descobrir o prazer de fatos cotidianos como dormir, comer e tomar banho, sem também achar que isso é o máximo a se conseguir na vida.
10 - Evite se envolver na ansiedade e tensão alheias. Espere um pouco e depois retome o diálogo, a ação.
11 - Família não é você, está junto de você, compõe o seu mundo, mas não é a sua própria identidade.
12 - Entenda que princípios e convicções fechadas podem ser um grande peso, a trava do movimento e da busca.
13 - É preciso ter sempre alguém em que se possa confiar e falar abertamente ao menos num raio de 100 km Não adianta estar mais longe.
14 - Saiba a hora certa de sair de cena, de retirar-se do palco, de deixar a roda. Nunca perca o sentido da importância sutil de uma saída discreta.
15 - Não queira saber se falaram mal de você e nem se atormente com esse lixo mental; escute o que falaram bem, com reserva analítica, sem qualquer convencimento.
16 - Competir no lazer, no trabalho, na vida a dois, é ótimo… para quem quer ficar esgotado e perder o melhor.
17 - A rigidez é boa na pedra, não no ser humano. A ele cabe firmeza.
18 - Uma hora de intenso prazer substitui com folga 3 horas de sono perdido. O prazer recompõe mais que o sono. Logo, não perca uma oportunidade de divertir-se.
19 - Não abandone suas três grandes e inabaláveis amigas: a intuição, a inocência e a fé.
20 - Entenda de uma vez por todas, definitiva e conclusivamente: você é o que se fizer.

quarta-feira, 23 de abril de 2008

Quem mata menina? - 2

SOBRE A CASA PATERNA

por Dulce Critelli

"Quando o pai deixou a menina em casa e voltou para buscar os outros filhos, será que trancou a porta ou a deixou aberta?" "Esta noite eu sonhei que quem matou a menina ..."

O assassinato de Isabella se impôs como o assunto constante destes últimos dias. Deixou-nos perturbados. E o que experimentamos não me parece ser uma comoção social, como aquela que vivemos quando, no Rio de Janeiro, João Hélio, um garotinho de seis anos, foi arrastado por quilômetros pelo carro dos assaltantes.

Há algo diferente na nossa inquietação. O assassinato de Isabella sugere que alguma coisa saiu do lugar e desarrumou o nosso mundo. Sentimos que, enquanto não decifrarmos seus agentes e suas razões, enquanto não compreendermos o sentido dos fatos, não poderemos retornar para a rotina aquietada dos nossos dias.

Já estamos calejados diante das atrocidades emergentes da violência social. É do mundo aí fora, acreditamos, é dessa selva urbana que insurgem todos os perigos que podem nos alcançar. Mas esse episódio entrou nas nossas casas, tornando vulnerável o único reduto que, nas nossas crenças mais profundas e ancestrais, era inviolável. Não a moradia, mas a casa paterna.

Nas simbologias de diversas culturas, o pai é representado pela coluna dorsal. Ele é a estrutura, o esteio, a força que suporta e dirige, a lei. Mais do que a mãe, é o pai quem oferece a casa para a qual todo filho pródigo pode regressar. Por meio da casa, o pai oferece o abrigo para o repouso e o reencontro depois das aventuras e das experiências fracassadas. A casa paterna é o lugar da segurança.

Isabella resumiu a nossa própria criança, a criança que confia e precisa confiar em sua segurança. Com ela, acreditamos que, enquanto dormimos, alguém nos vigia. Que se algo nos atacar, seremos defendidos. Que não perambulamos pela vida desabrigados e expulsos do paraíso.

Às vezes, os eventos que precisamos desesperadamente compreender para nos reinserirmos na vida são de natureza política, como ocorreu com o nazismo. Outros vêm da morte de alguém querido, de um casamento desfeito, de uma catástrofe natural que arrasa a terra, como tsunamis, incêndios e terremotos.

Mas esse acontecimento com que nos deparamos vem da angústia de nosso desamparo. Vem da suspeita do "pai". Se o "pai" for o transgressor, a moral está falida. Se o "pai" for a origem do mal, é como se descobríssemos que o mal está na raiz de nossa natureza e, portanto, projeta-se infinitamente sobre nosso futuro. Sem contenção, sem advertência, sem limite.

Se o mal vier do pai, quem poderá nos abençoar?


DULCE CRITELLI , terapeuta existencial e professora de filosofia da PUC-SP, é autora de "Educação e Dominação Cultural" e "Analítica de Sentido" e coordenadora do Existentia -Centro de Orientação e Estudos da Condição Humana.
Folha de São Paulo, quinta-feira, 17 de abril de 2008 http://www1.folha.uol.com.br/fsp/equilibrio/eq1704200801.htm

Quem mata menina?

COMOÇÃO PELA MORTE DE ISABELLA

A tragédia nos lembra afetos dolorosos que regram nossa maneira "moderna" de casar.

por Contardo Calligaris

Hoje, quarta-feira [9/4/2008], quando acabo esta coluna, não conhecemos os eventos que levaram à morte de Isabella Nardoni; só sabemos que a menina, de cinco anos, foi assassinada, intencionalmente ou não, enquanto estava na custódia do pai e da madrasta. E conhecemos um pouco a história da família: a mãe e o pai de Isabella não chegaram a se juntar -- foi um romance adolescente que acabou antes de Isabella nascer. O pai tem dois filhos pequenos com sua mulher atual.

É uma situação trivial: a pensão mensal, as visitas, o padrasto ou a madrasta, os meio-irmãos etc. Mas a banalidade dessa situação não deveria disfarçar o emaranhado de afetos dolorosos que ela produz -- afetos que muitos vivem e que todos preferimos esquecer.

Não sei se esses afetos são responsáveis pela morte de Isabella. Mas talvez eles sejam responsáveis pela extraordinária comoção produzida pela sua morte. Como assim?

A morte violenta de uma criança nos fere a todos: é como se, ao mesmo tempo, alguém nos arrancasse um pedaço de nosso próprio futuro e destruísse a fantasia nostálgica da infância, que sempre cultivamos, mesmo que o primeiro período de nossa vida tenha sido infeliz.

Mas a história de Isabella nos comove também por outra razão: as tentativas de "explicar" o acontecido evocam, inevitavelmente, as dificuldades de nossa maneira "moderna" de casar.

São dificuldades nas quais, em geral, preferimos evitar de pensar.

É comum que o marido ou a mulher (às vezes, ambos) levem para o casamento filhos que são frutos de uma relação anterior. Espera-se que isso aconteça sem complicação: afinal, se descasamos e casamos por amor, por que o mesmo amor não reinaria pelo lar todo? Pois é, o amor é uma coisa complicada.

Exemplos...

A rivalidade, que sempre existe entre irmãos, vinga entre enteados e meio-irmãos. E vinga redobrada, justamente por ser mais inconfessável do que a rivalidade entre irmãos -- por ser silenciosa, reprimida pelo esforço geral de compor uma nova família ideal, em que todos os integrantes se amariam.

Na nova família, à primeira vista, o homem convive com seus enteados melhor do que a mulher. Não é nenhum milagre do "instinto" paterno: o homem encontra uma satisfação narcisista no exercício da paternidade. Ele, aliás, curte ser e se sentir amado por suas qualidades "paternas". Para ele, saber ser pai de filhos e enteados faz parte de uma virilidade que ele quer que seja reconhecida e festejada pela mulher.

Mas cuidado: a encenação da paternidade, embora às vezes espalhafatosa, não resiste à pressão da culpa de dar para seus filhos de sangue menos do que para seus enteados.

Essa culpa, envergonhada e reprimida, é inevitável, porque há uma coisa que o homem, na grande maioria dos casos, dá mais aos enteados do que aos filhos: sua própria presença no lar.

A mulher, ao contrário, vive quase sempre uma rivalidade dramática com seus enteados: compete com eles como se ela fosse mais uma filha. Para a mulher, o enteado ou a enteada não usurpam o lugar dos filhos que ela trouxe de um casamento anterior, nem o lugar dos filhos que nasceram no novo casamento: eles ameaçam usurpar o próprio lugar dela. Essa rivalidade, escondida, expressa-se de maneiras travessas: por exemplo, numa crítica assídua das manifestações do afeto paterno do homem para com o filho ou a filha dele. Ou seja, para não admitir um ciúme envergonhado do enteado, a mulher censura o "excesso" dos sentimentos paternos do marido. Esse, criticado como pai, sente-se diminuído como homem. O desastre está às portas.

São apenas exemplos. O casamento "moderno" é um nó de afetos reprimidos, uma convivência explosiva que aposta no amor do casal como se fosse remédio para todos os males.

Não se trata de condenar a idéia de que seja possível refazer sua vida com outro ou outra e, nessa ocasião, levar consigo os filhos dos casamentos anteriores. Mas seria melhor que a gente se engajasse nesses projetos sem a ilusão de que os bons sentimentos prevalecerão por conta própria. Seria melhor, para começar, que nossas disposições menos nobres, em vez de silenciadas e reprimidas, fossem faladas, explicitadas. Isso, para evitar que, de vez em quando, a trágica morte de uma menina nos lembre, por um dia ou uma semana, que a vida das famílias "modernas" é muito mais difícil do que parece.

Folha de São Paulo, quinta-feira, 10 de abril de 2008 http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq1004200833.htm